29.7.06

O poeta e o cata-vento

Num dia distante no tempo
A arte de um homem nascia
E o pássaro da poesia
Mostraria
As asas do seu pensamento.

Adulto, agora lamento
Que quando o poeta vivia
Menino eu não percebia
Que um dia
O verso virasse alimento.

Captando do nada o momento
E vendo o que mais ninguém via
Fazendo do ar alegria –
Quem diria?
O poeta é também cata-vento.

(foto: http://www.bmsr.com.br/diario/detalhe.asp?cod=181)

18.7.06

Não sou deste mundo

Olho para um rosto sereno e silencioso, mas ele não me é indiferente. Algo nele me perturba, como se no fundo me questionasse quem, afinal, eu sou - e afasta o meu olhar. Quando tiver a coragem de olhar, como fazia Oscar Wilde, diretamente para as pupilas, perceberei por que aquele rosto me perturba. Estarei olhando para alguém como eu, que não faço parte deste mundo.

Quantos rostos impassíveis não ocultam de fato um coração que sangra? Quantas felicidades exuberantes na verdade dizem, por Deus, estou só, olhem para mim? Diria mais, quantas felicidades há?

Vejo no mundo que me deram um tamanho desequilíbrio que eu, terráqueo, não me sinto em casa. Os olhos sérios e já esgotados dos transeuntes. As esquinas frias, duras e cinzentas. O choramingar da mulher frente às moedas na caixa de sapatos. O menino que bate na mãe. A cultura falsificada que entope as ruas e os nascedouros de uma arte legítima. Os sonhos, as histórias e a sabedoria que a criança deixou de adquirir porque o governo garante aprovação na escola. Dinheiro, vantagem, poder, corrupção, mediocridade. O mundo padronizado pelas grandes corporações. O amor obrigado. Amor? Não, obrigado.

Esse jeito mediano e igual de pensar e agir me horroriza - pela liberdade que se deixa perder e pelo fato de eu não ser aceito se não pensar mediano também. As palavras têm sentidos miúdos e as almas são pequenas, já diria Fernando Pessoa... Que espaço haverá ainda para o olhar romântico, a cultura espontânea e verdadeira, a liberdade de expressão, o trabalho no lugar da preguiça, a justiça no lugar da vantagem, a filosofia em vez do fast-food, a poesia em vez da azia?

Então olho novamente para aquele rosto silencioso que não me era indiferente. Uma luz distinta e inexplicável naquele olhar me diz que ele chegou a ficar perturbado, também, em minha presença. Afinal, uma identidade que se deixou perceber.

Aqui e ali encontro pupilas assim, leais mas questionadoras, ambiciosas mas generosas, doces mas com um saboroso tempero picante. No fundo, somos todos nós almas sedentas de justiça, de liberdade, de paixão - mas diminuídas por este mundo mediano que não nos pergunta a cota necessária para a sobrevivência. É quando encontro esses olhos que vejo que nós, terráqueos de outro mundo, não estamos sós.

12.7.06

Tide

Just like the gray clouds blue sky will bring,
Just like a new one follows the old tide,
Don't leave the kingdom without a king;
Time ought to help you to find your own side.

10.7.06

Faltou a poção mágica

Estamos em 2006... todo o mundo foi conquistado pelos romanos. Todo? Sim! Desta vez, nem os irredutíveis gauleses, comandados pelos guerreiros Henrix e Zidanix, conseguiram deter a Squadra Azzurra, tetracampeã mundial de futebol. E, pela primeira vez, tive que concordar com Galvão Bueno, que me inspirou a abertura deste texto. Por Tutatis!

Já ouvi dizer que o problema de Galvão Bueno é não ser narrador, e sim torcedor enquanto narra. Não acho. Se fosse torcedor, ele não teria tanta dificuldade para apontar o que todo mundo viu: desde o início da Copa do Mundo recém-terminada, a Seleção Brasileira não mostrou condições de chegar às finais, quanto mais de se dizer “a maior favorita” para vencer a competição.

Se houve alguma justiça na Copa da Alemanha, foi a desclassificação do Brasil. Pois, de resto, como escreveu Hiltor Mombach no Correio do Povo, em futebol não há justiça, há resultados. Lugares-comuns à parte, a Itália sagrou-se tetracampeã, mas, nas oitavas-de-final, classificou-se contra a Austrália com um pênalti, aos 47 do segundo tempo, que não existiu. E, na final, derrotou nas penalidades uma França muito superior com a bola rolando.

A Copa da Alemanha também foi a Copa que desclassificou uma seleção – a Suíça – sem que tomasse um gol. E a Copa em que o melhor jogador – Zidane – decidiu, no dia da aposentadoria, desferir contra o peito do zagueiro italiano Materazzi uma cabeçada que mais parecia um golpe de menir do gaulês Obelix. Que oportunidade perdida para o grand finale de uma carreira!

A Itália, por outro lado, desencantou e deixou a política “o importante é não levar gols” de Copas anteriores. Houve algumas boas surpresas – gostei de ver Portugal, República Tcheca, Austrália, Gana e Costa do Marfim. Mas a Inglaterra que nos deu o futebol não mostrou ao que veio; a Holanda abriu a caixa de ferramentas contra a equipe de Felipão e também levou o seu; a “Fúria” espanhola chegou com muito cartaz e pouca obra; Argentina e Alemanha, apesar da boa regularidade, ficaram pelo caminho... e o Brasil foi o campeão do salto alto, com destaque para Roberto Carlos ajeitando a meia. Como correr para a pequena área e jogar a bola para escanteio sem quebrar o salto 15?


Nenhum grande astro, nenhuma seleção que realmente contagiasse, nenhuma unanimidade. Na Copa de 2006, os campeões foram a organização germânica, a beleza dos estádios e os cartões vermelhos. E a certeza de que a geração Fenômeno acabou. Novos talentos já mostraram ao que vieram, e uma grande renovação, de nomes e de técnica, será necessária se nossa Seleção quiser ser hexa em 2010, na África do Sul. Afinal, está mais que provado que Galvão Bueno nenhum garante o título para o Brasil, por mais que ele repita que Ronaldo Nazário é um craque. Não só os gauleses irredutíveis, mas também a Seleção Brasileira desta vez deixou em casa aquela famosa poção mágica que a torna invencível.

6.7.06

Provérbio

Lágrima mole num coração de pedra dura
Bate, bate, bate, mas a dor perdura.