14.2.06

O sentimento dos sentimentos

Algo se inquieta na fina e imperceptível linha que une o espírito, o cérebro e a mão. Essa linha começa a vibrar e, quando o tanger do espírito é compreendido pelo cérebro, às vezes a mão consegue traduzir o que ouviu – e vertem as palavras. Um inseto que se debate na teia da aranha? Pássaros que se agitam prenunciando a tempestade? O mar que recua avisando da onda que chega? Ora, quem dera esse grito fosse sempre escutado.

Porque é sempre maior a inquietude não percebida. Esta, a força-matriz da expressão – e muitas vezes também seu combustível – não encontrou quem a traduzisse, e o papel ficou em branco. Aprendo então que os sentimentos também têm sentimentos. Eles têm vergonha, medo, raiva, por vezes recusam-se a falar, aumentando em si mesma a inquietude. Por isso o autor calou-se tanto tempo. O náufrago deitou à água garrafas vazias e as poucas mensagens que mordiscaram a linha ou chegaram atrasadas, ou não se fizeram entender. Um monólito estava enterrado, enviando sinais fortíssimos, e eis que, uma vez desenterrado, nós, exploradores do espaço, quedamos ensurdecidos.

No entanto, algo faz sentido no que agora escuto, e a própria luz que apaguei se acende para mais um ou dois parágrafos. O que faltou foi determinação. A linha toca melodias diferentes conforme o compositor. Minha música ainda é tímida, parece sem vigor, sem emoção. É o sentimento dos meus sentimentos. Basta minha inquietude olhar para os lados mais firme, mais determinada, e verá que a poesia continua repousando ao lado; o milagre das palavras ainda está ali mesmo, esperando para acontecer.

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