11.6.07

Memória cinematográfica

Numa tarde dessas, uma tia de minha mulher comenta que havia visto na TV um filme com Al Pacino – mas qual era mesmo o filme?, pergunta ela, agora não lembro. Radar acionado ao ouvir o nome de um dos meus atores favoritos, bastou ela dizer que Pacino fazia um detetive que ia para o Alasca para eu responder: deve ser “Insônia”.

Poucas vezes tenho a resposta assim na ponta da língua, mas dessa vez tive sorte no quiz a que a tia sem querer me submeteu, talvez por causa de uma piada. Quando “Insônia” estava nos cinemas e eu disse no trabalho que o cineasta (Christopher Nolan) era o mesmo de “Amnésia”, meu chefe disse que o filme seguinte do diretor deveria se chamar “Enxaqueca”.

Infâmias à parte, pequenas circunstâncias como essa abrem na memória lugar para uma informação. Esse mesmo “Insônia” foi um dos filmes que marcaram, em 2001, minha autodescoberta como cinéfilo (um pouco mais dessa história eu conto aqui). Mas já bem antes disso eu percebi que minha memória, traidora quando o assunto é diálogos, piadas ou decoreba, poderia fazer as pazes comigo em frente a uma tela de cinema.

Era 1995, e eu assistia ao made for Sessão da Tarde “Lancelot – O primeiro cavaleiro”. O herói era Richard Gere, e o rei Arthur, ninguém menos que Sean Connery. Mas onde diabos eu havia visto antes o príncipe Malagant, vilão da história? Essa pergunta me martelou até quase o final do filme, quando de repente, como se Charlton Heston houvesse erguido os braços em frente ao Mar Vermelho, minha memória encontro o caminho para a informação perdida: o vilão era Ben Cross, um obscuro ator inglês de TV que fez o papel principal em “Carruagens de fogo”, filme que adorei. Era ele mesmo, 14 anos mais velho, um pouco mais gordo e um bocado mais sujo, pois as justas não eram mais em uma raia olímpica.

Daí em diante, comecei a me divertir tentando encontrar, apenas pela fisionomia, aqueles artistas que, como não nasceram para ser Roberto DeNiro, Brad Pitt ou Angelina Jolie, ficavam esquecidos, perdidos no meio do elenco, muitas vezes injustamente. Assim reencontrei na tela velhos amigos, que eu via de vez em quando e nem notava.

No diretor de prisão em “À espera de um milagre”, reencontrei o mesmo James Cromwell que foi o fazendeiro de “Babe”. “Bom porco”, ele dizia. Na mortal e estonteante Gail de “Sin City”, estava Rosario Dawson, aquela menina morena de “Kids”. E, em “O senhor dos anéis”, o decrépito rei Théoden não me era estranho; pudera, cinco antes, vi Bernard Hill afundar dignamente com o navio em que era capitão – o “Titanic”, nenhum outro. Isso sem contar o meio-elfo Elrond, ao qual faltavam apenas o paletó e os óculos escuros, não é, mister Anderson?

Tudo cultura inútil? Não, pois passei a olhar de forma diferente para a tela. Além de abrir novos espaços em minha memória, reforço a certeza de que o cinema não é apenas meia dúzia de grandes astros. Mais inútil é saber com quem está Leonardo DiCaprio ou a última extravagância de Tom Cruise. O talento também pode estar naqueles coadjuvantes ou mesmo nos figurantes, que nunca receberam da indústria a oportunidade certa para fazer parte da memória cinematográfica e por isso permanecem esquecidos.

2 comentários:

Katia K. disse...

Muito bem :-)
Cultura cinematográfica nunca é demais, hehe... Adorei o post, e espero que vc esteja de volta pra valer, meu amigo!
Abraços!

Anônimo disse...

Bravo!! Bravo!! Bravooooooooo!!! (Em pé e aplausos!!!)

Orgulho de ter você como meu irmão!!!