7.9.06

Sete de Setembro

Há alguns dias, encontrei, entre as páginas de um livro antigo, uma bandeira do Brasil. Ela era igual àquelas que recebíamos na escola e, ingenuamente, acenávamos na Semana da Pátria, sem termos noção do que aquele retângulo de papel verde-amarelo realmente representava. Para mim, eram manhãs ensolaradas de inverno, desfiles por obrigação, “Já podeis da Pátria filhos” e a vaga idéia de que vivíamos no melhor dos países.

No entanto, por mais forte que fosse a tão criticada imagem ufanista que os governos militares quisessem dar ao Brasil – sim, quando aprendi a ler e escrever o presidente era Médici –, uma sutil maré contrária acabou se mostrando mais poderosa que este país que vai pra frente. Afinal, eram oito anos de ditadura militar contra 472 de subserviência.

Não admira que patriotismo sempre tenha me parecido uma idéia confusa. Desfilar e cantar o hino contra a vontade mostrava tanto fundamento quanto associar o salesman Papai Noel a um Cristo despojado, nascido numa manjedoura. Tudo porque, entre um Sete de Setembro e outro, temos 364 dias de complexo de inferioridade.

Que sejamos uma terra de degredados, de cidadãos de segunda classe, de um rei que abandonou apavorado sua pátria. O problema é ainda nos sentirmos assim após tanto tempo. Afinal, os ingleses de segunda classe também cruzavam o Atlântico, rumo aos futuros Estados Unidos. Alguém um dia disse, e desde então, acreditamos, que o importado é sempre melhor. Nós, gaúchos, particularmente, chegamos ao ponto de nos acharmos melhores que o resto do país, salvos que fomos pela herança italiana e germânica. Racistas, nós? E brasileiro é raça?

Não é à toa que achamos ridículos ingleses e norte-americanos quando vestem roupas à la The Union Jack ou Stars and Stripes. O que se diz de alguém que ousa trajar verde e amarelo? “Parece uma bandeira do Brasil!” E qual é o problema? Ou quer me enganar que não ouvi um tom pejorativo na pergunta?

O tamanho de nosso patriotismo equivale ao das conquistas da Seleção. A Copa do Mundo é o único evento que vale a pintura dos meios-fios em verde e amarelo, e a certeza do hexa foi transformada, em apenas 90 minutos contra a França, na certeza de que nunca chegaríamos lá com aquele time.

Contribuem para essa visão nossa formação, nossa história, nossos governantes, mas também cada brasileiro, todos os dias. Temos um país rico, exuberante, com um povo inteligente, criativo – mas que não se ama. Não é o caso de louvar um ufanismo que existia para nos alienarmos e fecharmos os olhos para os desmandos de duas décadas de generais. É o caso de olharmos para nós mesmos e acreditarmos que podemos querer e ter o melhor para a nação. Se o ufanismo aliena, o baixo amor-próprio do brasileiro também, pois, fora o futebol, a Marquês de Sapucaí e a beleza feminina, não temos identidade, não procuramos nada do que nos orgulhar.

A solução? Isso passa pela educação, pela cultura, por décadas e décadas de melhor sorte nos governos. Séculos, talvez. A começar pela exigência dos pequenos direitos do cotidiano. Se não exigirmos, não nos será dado. Aos poucos, quem sabe, a idéia do direito de cada um possa alastrar-se e infiltrar-se na mente da nação que, lá fora, há de mostrar quem realmente podemos ser. Cidadãos que têm orgulho de seu país, seus símbolos e que podem legitimamente, no Sete de Setembro, comemorar sua independência das outras nações.

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